Há duas semanas antes desse Brevet, eu comprei uma bicicleta nova. Antes pedalava com uma bicicleta aro 26, com ela pedalei todos os brevet do ano, passado inclusive o Farrapos 1000. Surgiu uma grande dúvida em minha cabeça, com qual bike eu iria fazer os 1000 desse ano. Com a bike antiga eu estava bem adaptado, conhecia cada probleminha que ela me ocasionava. Só que eu queria render mais, por isso adquiri uma híbrida. Fiz dois testes com ela antes do Giro da Lomba, um pedal de 50 km, onde furei uma câmera, e outro pedal totalizando 240 km. No último treino nenhum furo, um ótimo rendimento, e uma ótima adaptação.
Depois desses 290 km com uma boa adaptação e sem nenhum problema maior, decidi fazer a prova com a híbrida.
Depois de toda a ansiedade antes da prova, havia chegado o grande momento, a largada. Mais de vinte ciclistas insanos para percorrerem 1007 km em setenta e cinco horas num percurso com uma altimetria desafiadora.
Após a largada perto do pedágio da Concepa na BR 290minha primeira câmera furada. Fiquei por último vendo os demais ciclistas me ultrapassarem. Lazary me ajudou dando a iluminação. A causa do furo foram fagulhas de pneus, que logo encontrei – as. Dali segui até Pantano Grande já no km 120 da prova com uma breve parada na Rabelândia para um café e uma torrada.
Vinte km depois dali, o segundo furo, dessa vez nenhum objeto foi encontrado. Novamente estava em último na prova. Mais alguns quilômetros e cheguei ao primeiro PC. Dei as câmeras ao voluntário Graxa consertar para mim, alguns minutos depois segui até Cachoeira do Sul, até chegar ao posto do Édison para fazer o abastecimento.
O dia estava ensolarado com o clima quente, o desgaste foi aumentando perto do meio dia. Depois de sair da BR 153 entrei na RST 287, foram 18 km de movimento intenso com um acostamento ridículo ao qual estou acostumado a pedalar seguidamente. Antes da temida subida de Candelária parei num boteco para abastecer bem as caramanholas e me alimentar para encarar a primeira grande lomba da prova. O sol continuava muito forte e me castigando. Pela metade da subida dei uma parada para refrescar a mente. Em seguida encontrei um ciclista que havia recém desistido da prova. Continuei até chegar ao PC dois em Passa Sete km 282 da prova. Os primeiros sinais de sono começavam a aparecer.
Em Arroio do Tigre encontrei o ciclista e voluntário pedalante Udo que havia saído do PC para tirar algumas fotos. Em Arroio do Tigre as descidas começaram a aparecer, mas logo sumiram e deram lugar a subidas novamente. Cheguei ao km 330 em Estrela Velha já anoitecendo junto com mais alguns ciclistas, Miorando, Amilkar, Francisco, Saul, Cláudio, Rafael e Gílson.
Eu estava bem desgastado, com sono, assim como o ciclista Gílson. Dei uma cochilada na mesa, enquanto Gílson deitou se um pouco numa poltrona. Após um tempo de cochilo acordei e aguardei os demais ciclistas para partirmos juntos.
Já em Salto do Jacuí encontramos o Jéferson e o Beto, ambos famintos. Não haviam parado em Estrela Velha. Dei meu sanduíche e algumas mariolas a eles, eu estava bem alimentado naquele momento. Sacrifiquei minha comida para os próximos 130 km para não ver dois parceiros desistirem do Brevet por falta de comida.
Fomos seguindo para Cruz Alta com bastante sono, gritando pela noite para o encosto do sono ir embora. Esperamos o Rafael tirar um cochilo nas moitas na beira da rodovia e seguimos. O frio estava ficando intenso pelas cinco horas da manhã eu precisando de um café e não havia nenhum estabelecimento aberto ainda. Nisso perto da PRF apareceu o Mogens, achei que fosse a salvação para o meu café, mas foi apenas mais um delírio. Mogens não tinha café, mas resolveu o problema. Foi até a polícia e conseguiu um café para nós. Logo após segui até o Hotel F4 em Ijuí enfrentando vários buracos na rodovia escura. Cheguei ao Hotel ás 5 e 10 da manhã, tomei um banho e tirei um sono de duas horas. Para acordar foi um inferno, a vontade de desistir foi grande. Fui forte e resolvi permanecer em estado vegetativo. Tomei o café da manhã e parti juntamente com o Cláudio para ingressar na BR 285. A rodovia possuía buracos no acostamento, em grande parte do trecho consegui andar sobre a linha branca com cuidado. O grande vilão desse trecho não foram os buracos aos quais muitos temiam, e sim as lombas e o vento contra que soprava.
Ninguém deu importância para estes dois elementos antes da prova. Talvez um erro de estratégia de alguns ou um simples esquecimento de tanto falar em buracos.
Depois de 30 km percorridos na 285 furei mais uma câmera de ar. Mais uma vez não encontrei nada no pneu.
Mais alguns km percorridos juntamente com o Cláudio e mais uma vez a maldita câmera fura, já era o quarto furo da prova. Verifiquei o pneu, a fita do aro, tudo parecia perfeito.
Após mais um conserto paramos para almoçar e continuamos com o vento a soprar contra e a subir mais lombas.
Chegamos ao PC virtual em Carazinho, á tardinha, onde comemos uma macarronada com ovos fritos e seguimos até ingressarmos na BR 386.
Estávamos bem cansados no km 600 da prova a pior parte do roteiro já havia sido feito. Sabíamos que a partir dali começaríamos a ter um trajeto mais fácil, isso se o sono deixasse. Eu estava num ritmo bom e resolvi pedalar um pouco mais rápido que os demais ciclistas que estavam comigo.
Cheguei ao PC5 em Soledade km 658 da prova por volta das 22 e 30 min. Mais um cochilo de meia hora e alimentação. Em seguida parti com os mesmos ciclistas que estavam comigo anteriormente e o Lazary que depois de se perder na rota e ir para Passo Fundo juntou – se a nós.
Alguns quilômetros a mais e decidimos tirar um cochilo num abrigo que encontramos na beira da rodovia. Deitamos sobre uma chapa de madeira e cochilamos, acordamos com um frio tremendo. Ninguém havia lembrado de pegar o cobertor de emergência para nos cobrirmos.
Mais alguns quilômetros madrugada adentro e chegamos em Vila Assis, onde paramos para tomarmos café e nos alimentar. Quando fomos partir o pneu traseiro estava murcho, quinto furo e nada de eu encontrar a maldição. Lazary me deu uma câmera nova, alemã, talvez essa seria a solução.
Seguimos em direção a Pouso Novo num trecho com 8 km de descidas constantes. Após a descida paramos no pedágio e esperamos pelos demais que estavam um pouco mais lentos. Velho Lazary e Baldasso resolveram não fazer o caminho por onde passam as motos e bicicletas, pegaram uma estradinha que dava do outro lado da cerca do pedágio para cassarem algumas borboletas ao amanhecer. Erraram o caminho devido aos delírios e as seqüelas.
Chegamos em Lajeado PC6 km 752 por volta das 8he30min da manhã, bastante cansados e com fome. Pedimos uma macarronada deliciosa para saciar nossa fome e em seguida partimos pela BR 386, com um lindo dia de sol.
Após uns 15 quilômetros de retomada de pedal, mais uma vez câmera traseira furada. Mais um conserto, sexto da prova. Cinco Km depois foi a vez do Baldasso furar uma. Paramos consertamos e seguimos. Dez quilômetros adiante mais uma vez, adivinhem de quem?
Já estava de saco cheio com essa perca de tempo, a vontade era grande para desistir. Mas ainda havia tempo e resolvi seguir com o psicológico muito abalado.
Começamos a pedalar num ritmo forte, para recuperarmos o tempo perdido. De Fazenda Vila Nova até o PC7 km 802 de Tabaí.
Deixei as coisas que não quis mais com a Luiza, voluntária da prova. Eliminei um pouco de peso, troquei de roda com o Udo, também voluntário para ver se terminava o meu problema com as câmeras. Cláudio e Baldasso saíram antes do que eu. Resolvi parar um pouco mais no PC.
Pedalei por cerca de mais 15 quilômetros e mais um furo. Oitavo da prova. Mesmo com outra roda furei de novo, falta de sorte.
Perto de Passo do Sobrado restando uns 140 km para o final do Brevet, mais uma vez furei. Eu não tinha mais condições de ficar verificando nada, mal conseguia trocar a câmera, estava com muito sono. Joguei bastante água no rosto e decidi pedalar num ritmo alucinante, atacando as subidas até o PC8 Km 902 no PPP em General Câmara. Um breve descanso e uma massagem nas pernas. Em seguida parti com o Gílson e o Lazary, onde os acompanhei até o Trevo de acesso a General Câmara. Eles pararam para tomar um café e eu segui, com medo de furar mais um pneu. Se assim fosse, ganharia um tempo em relação a eles. Estando atrás do Lazary na prova, era sinal que eu estaria atrasado, preferi ficar a sua frente.
Quando eu estava em Charqueadas o sono havia me dominado por completo, corri riscos de dormir em cima da bicicleta a qualquer momento. Vi vultos, assombrações e outras coisas que nem lembro. Estava delirando. Cheguei no Postaço em Charqueadas por volta das 22 e 30 min de domingo. Por milagre sem furar pneu. Restavam cerca de 50 km para o final da prova. Não sei de onde tirei forças para conseguir ficar acordado. Meu ritmo era muito lento, assim fui me arrastando até o final do Giro. Completei a prova faltando meia hora para o seu término.
Para mim foi uma grande superação, depois de tudo que havia me acontecido. Cansei mais de trocar câmeras do que pedalar.
A todos que terminaram a prova com sucesso, meus parabéns. Aos que desistiram por algum motivo, vocês são guerreiros e tiveram coragem em encarar uma prova de mil km numa altimetria desafiadora. Para as próximas provas virão mais fortes, podem crer.
Claiton (Bughera)
Poxa Vida. Que relato surpreendente. Realmente SUPERAÇÃO PURA. Parabens pelo relato, pela conquista. Esse ano de 2012 será minha iniciação em Audax. Vamos ver como será...
ResponderExcluirParebéns
Fabio
Valeu Fábio, sucesso em suas provas!!
ExcluirAbraço